Charge de Mariano para Charge Online
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Enviado por Rui Reche Barbosa, São
Paulo-Capital
220913
Onde estavam personagens do mensalão
há 40 anos
“Em 1968, José Dirceu e Celso de Mello moravam numa república de
estudantes em São Paulo, visitada frequentemente por agentes do Dops”
Por Maurício Cardoso, diretor de
redação da revista Consultor Jurídico
1968, o que fizemos de nós é o nome de um belo livro, do
jornalista Zuenir Ventura, lançado em 2008, como sequência de um outro livro
ainda mais lindo, 1968, o ano que não terminou, de 1989. Os dois livros falam de
um personagem incomum, o ano de 1968: “É possível que no século XX tenha havido
ano igual ou mais importante do que 1968, mas nenhum tão lembrado, discutido e
com tanta disposição para permanecer como referência, por afinidade ou por
contraste”, explica o autor na contracapa do último volume. E diz mais: “A
geração de 68, que dizia não confiar em ninguém com mais de 30 anos, está
completando 40. Ainda dá para confiar nela? Que balanço se pode fazer hoje de
um ano tão carregado de ambições e de sonhos? O que foi feito dessa herança?”
As questões que o livro de Zuenir procura responder podem
ser encontradas também, em larga escala, no plenário do Supremo Tribunal
Federal, todas as segundas, quartas e quintas-feiras, enquanto se julga a Ação
Penal 470, o processo do mensalão. O livro de Zuenir Ventura pode até não
explicar porque o partido que era apontado como mais ético e mais autêntico da
história da República se tornou patrono do maior escândalo de corrupção do
país. Mas ele mostra que boa parte dos principais personagens desse drama
político estavam todos lá em 1968, caminhando e cantando, e seguindo a
canção.
Quem abrir o livro à página 48, vai encontrar o capítulo Há
um meia-oito em cada canto. Vai saber que, nos idos de meia-oito, José Dirceu,
acusado de ser o “chefe da quadrilha” do mensalão, era um dos mais influentes
líderes do movimento estudantil. E que o ministro Celso de Mello, o decano do
tribunal que está julgando Dirceu juntamente com toda a “quadrilha”, era
praticamente colega do político. “Em 1968, José Dirceu e Celso de Mello moravam
numa república de estudantes em São Paulo, visitada frequentemente por agentes
do Dops”, conta o livro.
Os dois trilharam caminhos diferentes. “Dirceu foi para a
militância e Mello para os estudos”. Mas, em suas respectivas trincheiras,
defenderam os mesmos ideais de liberdade. Celso de Mello relembra o momento
difícil que enfrentou como orador da turma de promotores aprovados no concurso
do Ministério Público. “Eu precisava protestar contra o regime ditatorial, e
fiz um discurso que não agradou muito ao chamado establishment; não fui
aplaudido.”
Outros meia-oito ilustres que passaram pelo Supremo
Tribunal Federal já estão aposentados. Sepúlveda Pertence, que deixou o Supremo
em 2007, foi vice-presidente da UNE (1959-1960) e professor da UnB (1962-1965),
cargos dos quais se viu afastado à força pelo regime dos generais. Hoje é
integrante da Comissão de Ética Pública, ligado à presidência, criada
justamente para evitar que novos mensalões aconteçam.
O outro é Eros Grau, que se aposentou em 2010. Em uma de
suas últimas intervenções no Supremo, foi o relator da Ação Direta de
Inconstitucionalidade que julgou constitucional a Lei de Anistia. Adepto do
Partido Comunista (“nunca tive carteira, porque o partido não dava carteira,
mas eu tinha um comprometimento com as teses do partido, digamos assim”), foi
preso e torturado por sua atuação na resistência à ditadura.
“A geração de 68 não chegou a eleger nenhum presidente,
ainda que os dois últimos — Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da
Silva — considerem ter levado para o poder idéias e representates das turmas
com a qual reivindicam ter afinidades eletivas”, diz Zuenir, na abertura do
capítulo dos meia-oito. Claro, o livro foi lançado em 2008, época em que Dilma
Rousseff, ex-militante da VAR-Palmares, ainda não havia sido eleita presidente
da República. “Em face de sua resistência à tortura na prisão, o promotor que a
denunciou chamou-a de Joana D’Arc da subversão”, rememora Zuenir.
Além de Dilma e Zé Dirceu, são citados, ainda, como
representantes da geração meia-oito que chegaram ao poder na era Lula, o
governador da Bahia, Jaques Wagner (então presidente do diretório acadêmico da
PUC-Rio e militante do PCdoB), o prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel
(militante do movimento estudantil e da VAR-Palmares), o ex-ministro da Fazenda
e da Casa Civil Antônio Palocci (militante da organização trotskista Libelu,
juntamente com o ex-secretário da presidência Luiz Dulci e o ex-secretário de
Comunicação, Luiz Gushiken). Franklin Martins, que sucedeu Gushiken na
Secretária de Comunicação foi do MR-8 e seu secretário executivo Ottoni
Fernandes Junior, da ALN. O ministro da Cultura de Lula, Gilberto Gil não era
filiado a nenhum grupo militante, mas só de cantar, foi preso e proibido de se
apresentar, optando por se exilar na Inglaterra.
Tarso Genro, ministro da Educação e da Justiça no governo
Lula, foi ativista da UNE e do PCdoB e da dissidência desta, a Ala Vermelha,
que pregava a luta armada. Foram seus companheiros na militância esquerdista,
Milton Seligman, hoje diretor de Relações Corporativas da Ambev, e Paulo Buss,
presidente da Fundação Osvaldo Cruz. Os três compartilharam também as salas de
aula da Universidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul. “Era uma cidade
pequena, e todo mundo se conhecia. Diante da convocação de uma manifestação, o
Dops prendia os de sempre”. Que eram os três, relembra Seligman em entrevista
para o livro de Zuenir.
Também são meia-oito os verdes Fernando Gabeira,
ex-deputado federal pelo Rio de Janeiro, e Carlos Minc, outro ministro do
governo Lula. Mas não só no PT e no PV que se firmou o destino de quem viveu as
convulsões de 1968. Antes, muito pelo contrário, como sustenta Zuenir Ventura
ao resgatar o nome de dois ilustres meia-oito que tomaram outra direção. Um é o
ex-senador tucano pelo Amazonas e atual líder na corrida para a prefeitura de
Manaus, Arthur Virgílio Neto. Naqueles tempos, Arthur Virgilio era militante do
clandestino PCB e diretor do Centro Acadêmico da Faculdade Nacional de Direito
(atual UFRJ). Outro é o ex-prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia, que
pertenceu à Corrente, uma dissidência do PCB que pregava a luta armada. Foi
preso no Congresso da UNE, em 68 e foi para o exílio na Argentina e no Chile,
onde ficou amigo de outro militante de esquerda no exílio, José Serra.
Como diz Zuenir Ventura, “eles estão no poder, na oposição,
à esquerda, à direita, e até prestando contas à Justiça. Há um meia-oito em
cada esquina".
"Cría cuervos y te sacarán los
ojos"
Comentário do Jornal dos Amigos
Como diria Boris Casoy, “está tudo
dominado”.
Jornal dos Amigos
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