Por Olavo de Carvalho, Em 11 Dez 2014
Uma elite de
psicopatas sobe ao poder e se cerca de adeptos e militantes que, no afã de
enxergar as coisas como seus chefes mandam, acabam desenvolvendo todos os
sintomas da histeria
A saúde mental
de uma comunidade pode ser aferida pela dos indivíduos que ela eleva aos mais
altos postos e incumbe de representá-la. O mais breve exame do Brasil sob esse
aspecto leva a conclusões que já ultrapassam a escala do alarmante e se revelam
francamente aterrorizantes.
Já tivemos um
presidente que achava lindo fazer sexo com cabritas, se gabava de haver tentado
estuprar um companheiro de cela – prova de macheza, segundo ele – e confessava
entre risos as mais cínicas mentiras de campanha. É claro que a tropa dos seus
guarda-costas e marqueteiros corria, nessas ocasiões, para dar a essas
declarações o sentido de meras brincadeiras, mas, supondo que o fossem, é
igualmente evidente que pessoas adultas normais não se divertem com gracejos
tão torpes.
Qualquer que
fosse o caso, no entanto, a conduta desse cidadão não sugeria nenhuma doença
mental e sim propriamente uma psicopatia – a deformidade moral profunda que
sufoca a voz da consciência e autoriza o indivíduo a viver de manipulações,
trapaças e crimes sem nunca enxergar nisso nada de anormal.
Já mencionei,
em outros artigos, o livro do psiquiatra Andrew Lobaczewski, Ponerologia:
Psicopatas no Poder (Vide Editorial, 2014), em que uma equipe de médicos
poloneses condensa os resultados de décadas de observação da elite comunista
que dominava o país, e descreve tecnicamente o fenômeno da
"patocracia", o governo dos psicopatas.
Mas, como
explica o próprio dr. Lobaczewski, quando uma elite de psicopatas sobe ao
poder, ela se cerca de adeptos e militantes que não são psicopatas, mas que, no
afã de enxergar as coisas como seus chefes mandam em vez de aceitar os dados da
realidade, acabam desenvolvendo todos os sintomas da histeria. A histeria é um
comportamento fingido e imitativo, no qual o doente nega o que percebe e sabe,
criando com palavras um mundo fictício cuja credibilidade depende inteiramente
da reiteração de atitudes emocionais exageradas e teatrais.
Um exemplo, já
antigo, esclarecerá isso melhor.
Todo mundo
conhece o deprimente episódio da discussão feia na qual a deputada Maria do
Rosário xingou seu colega Jair Bolsonaro de "estuprador". Incrédulo,
o deputado perguntou:
-- Agora sou eu
o estuprador?
A deputada,
fria e pausadamente, confirmou:
-- É sim.
O deputado, que
não é lá muito famoso pelas boas maneiras, deu-lhe uma resposta brutalmente
sarcástica ("não vou estuprar você porque você não merece") e a
adversária ameaçou dar-lhe uns tapas, deixando de cumprir o intuito ante a
promessa de um revide, sendo então chamada de "vagabunda" e tendo um
dos mais célebres chiliques da história política nacional.
Está tudo
gravado.
As
circunstâncias que precederam o acontecimento são muito reveladoras. Bolsonaro
tinha apresentado um projeto de lei que previa penas mais severas para os
estupradores, inclusive antecipando o prazo de maioridade penal para que a
punição pudesse alcançar tipos como Roberto Aparecido Alves Cardoso, o
Champinha, um dos estupradores e assassinos mais cruéis que este país já
conheceu.
Maria do
Rosário era contra a antecipação da maioridade e defendia penas mais brandas
para estupradores e assassinos de menos de dezoito anos.
O projeto do
deputado Bolsonaro era aprovado por mais de 90% da população.
Defensora de
uma causa impopular, e cunhada, ela própria, de um estuprador de menores, Maria
do Rosário tinha todos os motivos para ficar com os nervos à flor da pele
quando se discutia estupro e menoridade. Chamar de estuprador o algoz maior dos
estupradores não fazia o menor sentido, evidentemente, exceto como inversão
histérica da situação real.
Do ponto de
vista penal, admitindo-se que ambos os parlamentares tenham cometido delitos, o
da deputada foi bem mais grave. Nosso Código Penal pune com seis meses a dois
anos de detenção o crime de calúnia (imputação falsa de ato delituoso) e com
apenas um a seis meses de detenção o de injúria (ofender a dignidade e o decoro
de alguém). Pior: a lei concede atenuante ao delito de injúria se é cometido em
revide a insulto anterior, e um segundo e maior atenuante se o revide foi
imediato. Os dois atenuantes aplicavam-se à conduta do deputado Bolsonaro. Em
comparação com Maria do Rosário, ele estava praticamente inocente no episódio.
Bem, esses são
os dados objetivos da situação, mas a reação da esquerda nacional quase
inteira, seguida de perto por toda a grande mídia, foi levantar um escarcéu dos
diabos contra o deputado, chegando a pedir a cassação do seu mandato e
apresentando Maria do Rosário como vítima inocente de uma violência verbal
intolerável.
Por mais
intenso que seja o ódio político que se vota a um inimigo, simplesmente não é
normal inverter de maneira tão flagrante a lógica dos fatos e o seu sentido
jurídico para fazer do agredido o agressor e do revide injurioso, por mais
grosseiro que fosse, um crime mais grave que o de calúnia.
Pior: todos os
que incorreram nessa loucura faziam-no em tom de tão profunda indignação –
alguns chegando até às lágrimas --, que não pareciam, de maneira alguma, estar
mentindo deliberadamente. Ao contrário: a coisa era uma inversão histérica
genuína, característica, indisfarçável. E coletiva.
A passagem do
tempo não parece tê-la curado, mas agravado. Ainda esta semana, como o deputado
Bolsonaro relembrasse o episódio, mostrando não arrepender-se do que tinha dito
a Maria do Rosário, a deputada Jandira Feghali viu nisso, não, como seria
normal, uma prova de falta de educação, mas – pasmem – uma confissão de
estupro. E, aos berros, exigia a cassação do mandato de Bolsonaro, alegando que
"não podemos admitir a presença de um estuprador nesta Casa". Não
deixa de ser significativo que, nessa mesma semana, uma pesquisa da
Universidade da Califórnia revelasse que a incapacidade de perceber o sarcasmo
pode ser um sintoma de demência.
Porém ainda
mais significativo é que, também na mesma semana, a deputada, lendo uma frase
minha segundo a qual todos deveríamos "atirar à cara dos comunistas, em
público, todo o mal que fizeram", lançou o alarma: Olavo de Carvalho prega
assassinato de comunistas!
O histérico não
enxerga o que está diante dos seus olhos, mas o que é projetado na tela da sua
imaginação pelo medo e pelo ódio.
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"Embora
ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar
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