Por Marco Antonio Villa
E Lula não vai sair
do poder sem antes usar de todas as armas, legais ou não.
Em 2015, em meio a
muita tensão política, a Constituição de 1988 terá sua prova de fogo. Não há
qualquer paralelo com o episódio do impeachment de Fernando Collor. Este já
tinha percorrido mais de dois anos de mandato quando foi apeado do poder. E o
momento mais agônico da crise foi resolvido em quatro meses — entre julho e
outubro de 1992.
Também deve ser
recordado que o então presidente tinha um arremedo de partido político, sua
conexão com a sociedade civil era frágil — e quase nula com os setores
organizados, a relação com o Congresso Nacional era ruim, e com medidas
heterodoxas descontentou amplos setores, do empresariado ao funcionalismo
público. Sem contar que, em 1990, o país passou por uma severa recessão (-4,3%)
e tudo indicava — como efetivamente ocorreu — que, em 1992, teria uma nova
recessão.
O quadro atual é
distinto — e causa muito mais preocupação. O governo tem um sólido partido de
sustentação — que está em crise, é verdade, mas que consegue agir coletivamente
e tem presença dominante em governos estaduais e dezenas de prefeituras. A base
congressual é volátil mas, aparentemente, ainda responde ao Palácio do
Planalto. As divergências com o sócio principal do condomínio petista, o PMDB,
são crescentes mas estão longe do rompimento. Em 12 anos, o governo construiu —
usando e abusando dos recursos públicos — uma estrutura de apoio social. E, diferentemente
de Collor, Lula estabeleceu uma sólida relação com frações do grande capital —
a "burguesia petista" — que é hoje dependente do governo.
O país está vivendo
um impasse. O governo perdeu legitimidade logo ao nascer. Dilma não tem
condições de governar, não tem respeitabilidade, não tem a confiança dos
investidores, dos empresários e da elite política. E, principalmente, não tem
mais apoio dos brasileiros horrorizados com as denúncias de corrupção e a
inépcia governamental em enfrentá-las, além do agravamento dos problemas
econômicos, em especial da inflação.
Deve ser
reconhecido que Fernando Collor aceitou o cerco político que sofreu sem
utilizar da máquina de Estado para coagir os adversários. E foi apeado
legalmente da Presidência sem nenhum gesto fora dos limites da Constituição.
Mas o mesmo não ocorrerá com Dilma. Na verdade, não com Dilma. Ela é um nada, é
uma simples criatura, é um acidente da História. O embate vai ser travado com
Lula, o seu criador, mentor e quem, neste momento, assumiu as rédeas da
coordenação política do governo.
Foi Lula que venceu
a eleição presidencial de 2014. E agora espera repetir a dose. Mas a conjuntura
é distinta. As denúncias do petrolão e a piora na situação econômica não
permitem mais meros jogos de cena. O momento do marketing eleitoral já passou.
E Lula vai agir como sempre fez, sem nenhum princípio, sem ética, sem respeito
a ordem e a coisa públicas. O discurso que fez no Rio de Janeiro no dia 24 de
fevereiro é apenas o início. Ele — um ex-presidente da República — incitou à
desordem, ameaçou opositores e conclamou o MST a agir como um exército, ou
seja, partir para o enfrentamento armado contra os adversários do projeto
criminoso de poder, tão bem definido pelo ministro Celso de Mello, do STF.
Lula está desesperado.
Sabe que a aristocracia petista vive o seu pior momento. E não vai sair do
poder sem antes usar de todas as armas, legais ou não. Como um excelente leitor
de conjuntura — e ele o é — sabe que os velhos truques utilizados na crise do
mensalão já não dão resultado. E pouco resta para fazer — dentro da sua
perspectiva. Notou que, apesar de dezenas de partidos e entidades terem
convocado o ato público do dia 24, o comparecimento foi pífio, inexpressivo. O
clima no auditório da ABI estava mais para velório do que para um comício nos
moldes tradicionais do petismo. Nos contatos mantidos em Brasília, sentiu que a
recomposição do bloco político-empresarial que montou no início de 2006 — e que
foi decisivo para a sua reeleição – é impossível.
A estratégia lulista
para se manter a todo custo no poder é de buscar o confronto, de dividir o
país, jogar classe contra classe, região contra região, partido contra partido,
brasileiro contra brasileiro. Mesmo que isso custe cadáveres. Para Lula, pouco
importa que a crise política intensifique ainda mais a crise econômica e seus
perversos efeitos sociais. A possibilidade de ele liderar um processo de
radicalização política com conflitos de rua, greves, choques, ataques ao
patrimônio público e privado, ameaças e agressões a opositores é muito grande.
Especialmente porque não encontra no governo e no partido lideranças com
capacidade de exercer este papel.
O Brasil caminha
para uma grave crise institucional, sem qualquer paralelo na nossa história.
Dilma é uma presidente zumbi, Por incrível que pareça, apesar dos 54 milhões de
votos recebidos a pouco mais de quatro meses, é uma espectadora de tudo o que
está ocorrendo. Na área econômica tenta consertar estragos que produziu no seu
primeiro mandato, sem que tenha resultados a apresentar no curto prazo. A
corrupção escorre por todas as áreas do governo. Politicamente, é um fantoche.
Serve a Lula fielmente, pois sequer tem condições de traí-lo. Nada faria
sozinha.
Assistiremos à
lenta agonia do petismo. O custo será alto. É agora que efetivamente testaremos
se funciona o Estado Democrático de Direito. É agora que veremos se existe uma
oposição parlamentar. É agora que devemos ocupar as ruas. É agora que teremos
de enfrentar definitivamente o dilema: ou o Brasil acaba politicamente com o
petismo, ou o petismo destrói o Brasil.
Marco Antonio Villa
é historiador
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